5.9.10 Distintividade adquirida¶
5.9.10.1 Definição¶
O direito de marcas exige que o sinal marcário seja distintivo. Para ser dotado de distintividade inerente (ou absoluta), o sinal não pode ser constituído unicamente por termos, expressões ou imagens que mantenham relação direta com o produto ou serviço assinalado, pois, a princípio, o consumidor não reconheceria esses elementos como marcas, mas apenas como descrições ou representações do produto ou serviço. O sinal também não pode ser formado somente por termos, expressões ou imagens que, pela sua própria natureza, não são capazes de serem percebidos como marca pelo público-alvo, tais como letras, datas ou algarismos isolados, cores e suas denominações isoladas, entre outros.
Informações detalhadas sobre as proibições relacionadas à falta de distintividade do sinal, previstas nos arts. 122 e 124, incisos II, VI, VII, VIII, XVIII e XXI da LPI, podem ser encontradas no item 5.9 Análise do requisito de distintividade do sinal marcário.
Entretanto, em situações excepcionais, um signo originalmente desprovido de distintividade pode adquirir, com o uso, eficácia distintiva suficiente para possibilitar seu registro como marca. A esse fenômeno dá-se o nome de distintividade adquirida. Nestes casos, o consumidor passa a compreender o sinal como marca, ou seja, como um signo capaz de identificar os produtos ou serviços por ele assinalados, diferenciando-os de outros oferecidos por concorrentes. Assim, ocorre um acréscimo semântico ao sinal, que agrega um novo conceito aos produtos ou serviços e promove um significado adicional na mente do consumidor, sem prejuízo daquele já existente. Acrescenta-se ao significado primário (a relação direta com o produto ou serviço) um significado secundário (o da marca).
5.9.10.2 Requerimento de análise de distintividade adquirida¶
O exame da aquisição da distintividade poderá ser requerido apenas:
a) na data de protocolo do pedido de registro de marca, mediante manifestação clara e expressa a ser anexada à petição de depósito do pedido de registro em questão;
b) no prazo máximo de 60 (sessenta) dias contados da data de publicação do pedido de registro, mediante manifestação clara e expressa a ser anexada à petição de manifestação;
c) na data de protocolo de recurso administrativo contra decisão de indeferimento de pedido de registro de marca fundado na ausência de distintividade inerente, mediante manifestação clara e expressa a ser anexada à petição de recurso contra o indeferimento do pedido de registro em questão;
d) na data de protocolo de manifestação à oposição fundamentada em ausência de distintividade, mediante manifestação clara e expressa a ser anexada à petição de manifestação; ou
e) na data de protocolo de contrarrazões a processo administrativo de nulidade fundamentado em ausência de distintividade, mediante manifestação clara e expressa a ser anexada à petição de contrarrazões.
Nos casos (a), (b) e (d), tal manifestação será realizada por meio de declaração anexa à petição correspondente, solicitando que, durante o exame de registrabilidade ou do processo administrativo de nulidade, seja levado em conta conjunto comprobatório de que o signo adquiriu, por meio de seu uso, eficácia distintiva suficiente para que seja registrado como marca. Nos casos (c) e (e), tal manifestação será realizada por meio de marcação de quadrícula específica disponibilizada no formulário de recurso contra o indeferimento.
Não será conhecido o pedido de reconhecimento de aquisição de distintividade se requerido mais de uma vez no mesmo processo ou fora das hipóteses acima estabelecidas. Portanto, não será conhecido o pedido protocolado após a decisão de indeferimento do pedido de registro, sem interposição de recurso, ou após a decisão final do recurso contra o indeferimento – a qual resulta no encerramento do trâmite administrativo.
Nas hipóteses de recurso e contrarrazões a processo administrativo de nulidade, o requerente deverá informar, no formulário da respectiva petição, o momento em que o INPI deverá avaliar a aquisição de distintividade. Mais informações podem ser obtidas nos itens 7.2.3 Recursos com base em distintividade adquirida e 7.3.3 Trâmite dos processos administrativos de nulidade com base em ausência de distintividade e a alegação de distintividade adquirida.
No prazo máximo de 60 (sessenta) dias contados da solicitação de análise de distintividade adquirida pleiteada nos prazos previstos acima, o requerente deverá protocolar petição de “Apresentação de documentos para comprovação de distintividade adquirida” (Serviço 3021).
| Como solicitar o serviço | ||
| Serviço: | Apresentação de documentos para comprovação de distintividade adquirida | |
| Código: | 3021 | |
| Informações adicionais: | 3.6.2 Petições de oposição, processo administrativo de nulidade e caducidade Tabela de Retribuições |
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Por se tratar de fenômeno decorrente do uso efetivo e continuado de uma marca, a distintividade adquirida será analisada a partir de conjunto probatório apresentado no requerimento de análise de distintividade adquirida, conforme disposições constantes do capítulo XVI-A “Distintividade Adquirida”, da Portaria INPI/PR nº 8/2022.
A documentação comprobatória da aquisição de distintividade pelo uso deverá demonstrar:
- O uso substancialmente contínuo da marca durante os 03 (três) anos imediatamente anteriores à data de requerimento de exame da aquisição da distintividade; e
- Que relevante parcela do público consumidor nacional reconhece o sinal como marca, ou seja, como um signo capaz de identificar os produtos e serviços a ele associados, diferenciando-os de outros oferecidos pelos concorrentes.
O conjunto probatório apresentado poderá ser complementado pelo requerente por meio de aditamento à petição de apresentação de documentos para comprovação de distintividade adquirida ou em resposta a exigência formulada pelo INPI, sendo observados os prazos cabíveis em ambos os casos.
Da decisão decorrente do exame de aquisição de distintividade pelo uso caberá recurso.
5.9.10.3 Análise de provas¶
As provas apresentadas ao INPI devem demonstrar que o signo em questão ultrapassou seu sentido primário, sendo capaz de identificar a origem dos produtos ou serviços perante o público consumidor.
Dessa forma, com base no conjunto probatório apresentado para comprovação de distintividade adquirida, o INPI avaliará se o sinal em exame adquiriu suficiente distintividade para ser reconhecido como marca para assinalar os produtos ou serviços elencados na especificação do pedido de registro ou do registro em questão. A decisão proferida pelo INPI será referente ao sinal como um todo, e não sobre componentes isolados do signo.
É importante destacar que o fenômeno de aquisição de distintividade não se confunde com a comprovação de notoriedade, uma vez que o que se pretende demonstrar por meio das provas é a mudança de percepção semântica do público consumidor específico com respeito ao signo, que passa a ter capacidade de cumprir com sua função marcária de identificar e distinguir a origem dos produtos ou serviços assinalados.
Para comprovar que o signo em questão é reconhecido por seu público consumidor como efetivo e singular identificador da origem de produtos ou serviços, faz-se necessária a apresentação de pesquisas de mercado, consideradas como instrumento mais apropriado para tal finalidade.
O requerente poderá anexar ao conjunto probatório o detalhamento do volume de investimentos realizados ao longo dos anos para fortalecer a marca, relacionando tanto a marca quanto os investimentos aos produtos ou serviços reivindicados, e demonstrando ainda a natureza (tipo de mídia) e alcance geográfico.
Cabe ressaltar que as provas apresentadas devem ter abrangência nacional. Não serão consideradas pertinentes provas oriundas do exterior ou obtidas por meio da internet, sem que seja demonstrado que o público atingido é o brasileiro. É necessário, ainda, que as provas demonstrem a aquisição de distintividade em todas as regiões do país, tendo em vista que o registro concedido será válido para todo o território nacional.
Exemplos:
| Marca | Observações |
![]() Para assinalar "camisas" |
Provas apresentadas: • Demonstração de acessos anuais ao sítio da internet do fabricante, sem identificação da origem dos acessos; • Informação do número de likes mensais em página da rede social, sem indicação da origem dos usuários; • Relatórios de vendas anuais de produtos em diversos países da União Europeia e nos Estados Unidos; e • Valores gastos anualmente com propaganda em países da América Latina como um todo. Provas não consideradas aptas. Os documentos não possuem caráter probatório capaz de demonstrar a percepção do público consumidor nacional com relação à marca. |
![]() Para assinalar "alimentos macrobióticos" |
Provas apresentadas: • Demonstração de acessos mensais ao sítio nacional da internet do produtor, identificando-os como acessos nacionais e discriminando-os por estado; • Relatórios de vendas mensais dos produtos em todas as capitais do Brasil e no Distrito Federal; e • Valores gastos anualmente com propaganda em rádio, televisão e internet, por meio de influenciadores conhecidos nacionalmente. Provas consideradas aptas. Os documentos possuem valor probatório em razão da abrangência nacional, devendo ser apreciadas a extensão e a representatividade dos mesmos. |
Para assinalar "comércio de instrumentos musicais" |
Provas apresentadas: • Histórico da empresa peticionante, informando sua inauguração em 1930 e destacando sua tradição na prestação dos serviços em questão; • Declarações de consumidores residentes na cidade de São Paulo, em que reconhecem o signo em questão como marca; e • Declarações de proprietários de lojas vizinhas, concorrentes e não concorrentes, em que reconhecem o signo em questão como marca. Provas não consideradas aptas. Os documentos não possuem caráter probatório adequado, uma vez que se referem a público eminentemente regional, não havendo demonstração de reconhecimento nacional. |
A aquisição de distintividade deve ser demonstrada com base em sinal de apresentação idêntica à que se busca registrar, visto que outros elementos presentes em apresentações distintas podem influenciar a percepção do consumidor médio sobre a marca. Por exemplo, a demonstração de aquisição de distintividade de um signo de apresentação nominativa deverá ser realizada com base apenas em sua forma verbal, não sendo admitidas provas que contenham elementos visuais adicionais, uma vez que não se pode estimar o efeito desses elementos sobre o público-alvo.
Exemplo:
| Marca | Observações |
| DELÍCIA (marca nominativa) Para assinalar "frutas" |
Provas apresentadas: • Documentos que demonstram o uso da marca em embalagens onde a marca é apresentada da forma ilustrada abaixo: Provas não consideradas aptas. Documentos não possuem caráter probatório adequado, por se referir a marca com apresentação diversa daquela requerida, não sendo possível avaliar o impacto da apresentação mista do sinal na percepção do público consumidor. |
Em razão da excepcionalidade do fenômeno da distintividade adquirida, as provas apresentadas devem estar relacionadas a cada um dos produtos ou serviços listados no pedido de registro ou no registro em questão, ficando o reconhecimento da aquisição da distintividade pelo uso limitado apenas aos itens da especificação efetivamente comprovados.
Exemplo:
| Marca | Observações |
| DELÍCIA (marca nominativa) Para assinalar "frutas" |
Provas apresentadas: • Documentos demonstram o uso continuado da marca durante os 03 (três) anos prévios ao requerimento, comprovando a aquisição de distintividade somente em relação a “pêssegos”. Provas consideradas parcialmente aptas: Sendo as provas capazes de demonstrar a aquisição de distintividade apenas para o produto “pêssegos”, o reconhecimento será especificamente para este item, sendo aplicada ressalva para adequação da especificação. |
No que se refere a investimentos para fortalecimento da marca, a descrição dos valores despendidos pelo requerente deve ser acompanhada de dados adicionais que permitam associar o impacto de tais investimentos à percepção do público-alvo sobre a marca, para fins de comprovação da aquisição de distintividade.
Vale observar que declarações feitas por terceiros que possuem relação comercial com o requerente não constituem, por si só, prova suficiente da aquisição de distintividade, uma vez que a manutenção de relações comerciais com a parte interessada pode comprometer a objetividade destas declarações, que deverão ser corroboradas por outros elementos de prova. Declarações de associações profissionais independentes, organizações de consumidores e concorrentes terão maior relevância para a análise, por serem provenientes de fontes presumidamente imparciais.
Exemplo:
| Marca | Observações |
| SABOROSA (marca nominativa) Para assinalar "cervejas artesanais" |
Provas apresentadas: • Declarações de fornecedores de matéria-prima para a fabricação dos produtos, declarações de bares e restaurantes que servem os produtos e declaração da ABRACERVA – Associação Brasileira de Cervejas Artesanais, todas atestando que a marca em questão adquiriu capacidade distintiva através do uso continuado perante o público consumidor. Provas consideradas aptas. Dentre os documentos citados, possui maior relevância a declaração da ABRACERVA, órgão representativo de produtores de cerveja que não tem interesse direto na obtenção do registro pela requerente. As demais declarações citadas possuem menor relevância para a análise, pois provêm de parceiros comerciais com interesse direto no reconhecimento da distintividade adquirida do sinal. |
Alerta-se para a necessidade de demonstração de uso exclusivo do signo, de modo que este identifique uma única origem dos produtos e serviços perante o público consumidor. A existência de outras marcas registradas de terceiros contendo o signo em apreciação será indicativa de disseminação de seu uso comercial, prejudicando o reconhecimento da distintividade adquirida pelo uso.
Exemplo:
| Marca | Observações |
| DOCE CASEIRO (marca nominativa) Para assinalar "serviços de alimentação" |
Indeferimento pelo inciso VI do art. 124 da LPI. A despeito de quaisquer provas produzidas, não será possível identificar claramente a origem comercial dos serviços prestados pela requerente, em vista da convivência de diversos registros contendo a expressão “DOCE CASEIRO” em destaque para diversos outros titulares no mesmo segmento, conforme exemplos (fictícios), abaixo: ![]() Desta forma, o signo em questão não possuirá suficiente distintividade para ser reconhecido como identificador comercial de origem singular, não havendo elementos suficientes para que este seja distinguido em relação aos demais. |
Sinais necessários, genéricos ou que configurem reprodução realista de produtos ou de suas embalagens, conforme estabelecido nos itens 5.9.3 Sinal irregistrável por seu caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo e 5.9.9 Casos específicos no exame da distintividade, não são passíveis de adquirir distintividade pelo uso, independentemente da quantidade de provas anexadas.
Exemplo:
| Marca | Observações |
| LEITE EM PÓ DESNATADO (marca nominativa) Para assinalar "leite em pó" |
Indeferimento pelo inciso VI do art. 124 da LPI. O sinal é formado pela designação necessária do produto, sendo completamente desprovido de distintividade e impossibilitando que o público consumidor o identifique como a única origem dos produtos assinalados. |


